domingo, 31 de agosto de 2008

A terceira margem do rio

Ele me escutou. Ficou em pé. Manejou remo n´água, proava pra cá, concordando. E eu tremi, profundo, de repente: porque, antes, ele tinha levantado o braço e feito um saudar de gesto - o primeiro, depois de tamanhos anos dsecorridos! E eu não podia... Por pavor, arrepiados os cabelos, corri, fugi, me tirei de lá, num procedimento desatinado. Porquanto que ele me pareceu vir: da parte de além. E estou pedindo, pedindo, pedindo um perdão.
Sofri o grave frio dos medos, adoeci. Sei que ninguém soube mais dele. Sou homem, depois desse falimenteo? Sou o que não foi, o que vai ficar calado. Sei que agora é tarde, e temo abreviar com a vida, nos rasos do mundo. Mas, então, ao menos, que, no artigo da morte, peguem em mim, e me depositem também numa canoinha de nada, nessa água que não pára, de longas beiras: e, eu, rio abaixo, rio a fora, rio a dentro - o rio.


(ROSA, João Guimarães. Primeiras estórias. José Olympio, RJ, 1988, p. 37)
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