terça-feira, 30 de agosto de 2022

O desafio de voltar a correr. Corridas: o prazer pela longevidade. (Episódio 01/2022)

O desafio de voltar a correr

Aos sessenta e um anos, um menino chegou na minha vida.  Já com tudo estabilizado: casado, servidor público, no último nível de formação acadêmica, faltando apenas juntar os documentos para me aposentar, pai de duas filhas, adultas casadas, formadas e, também, funcionárias públicas, presentes do meu meu primeiro casamento. 

Eu e Ana Paula, minha companheira  não havíamos planejado uma criança que, efetiva e definitivamente, mudou as nossas vidas, claro, pra bem melhor! 

Tudo se reveste de outros significados num casamento, depois de quase 30 anos!!!

Com a sua chegada, tudo mudou em nossas vidas, principalmente, nossos objetivos e planejamentos: tudo agora incluiria nosso filho! 



No seu segundo aninho de vida, e eu, prestes a concluir o doutorado com a defesa de minha tese,  o Brasil mergulha num pesadelo que persiste até o momento em que inicio este texto. 

Nosso país conhece o seu mais sinistro momento histórico: a eleição de um governante, que, ainda em sua campanha já havia se mostrado déspota, homofóbico, misógeno e fascista e, logo, logo seria percebido, além de despreparado para o cargo, algo bem pior.  

A luta pela liberdade e pela democracia sempre foi uma constante na minha vida e da minha família. Talvez ai resida a minha paixão por um dos esportes tão democrático quanto o futebol no nosso país: as corridas de rua. Elas atraem pessoas de todas as classes sociais, cor, religião, condição sexual, idade...

Estudante universitário,  participei do movimento pelas Diretas Já, após um longo período de ditadura civil militar, militei pelas causas sociais, consciente da minha classe social.

Estive presente em diversas manifestações históricas, dentre elas, a principal: o ato pela democracia na Avenida Presidente Vargas, no Rio de Janeiro, em 1988, quando, também, participei da minha primeira maratona, a do Rio de Janeiro.

Minha mãe e irmãos sempre militaram por um país justo e democrático e procuramos passar para os nossos filhos um pouco de nossa história e comprometimento na construção de uma sociedade mais justa e igualitária.

Permanecemos tentando manter o estado de Direito democrático por mais de trinta anos antes do golpe contra a democracia e instalação de governo que iria facilitar as retiradas dos direitos dos trabalhadores, enriquecimento das elites às custas do empobrecimento das famílias brasileiras. 

Em meio ao caos social, fome e desemprego, uma nova tragédia, - claro, de maior magnitude! - acometeu, agora,  todo o planeta: a pandemia do novo coronavírus.

 Em seu primeiro ano, em 2020, ceifou a vida de 250 mil brasileiros, grande parte, devido à política genocida, que, aliada a uma propaganda negacionista de Jair Bolsonaro, com suas claras e eficazes ações para a rápida e maior disseminação do vírus.

Além do atraso na compra de vacinas, retardou o envio de balões de oxigênio para a cidade de Manaus  contribuindo para deslustrar a imagem do SUS, que já vinha sofrendo com sua depauperação 



José estava em seu primeiro ano de creche tendo comparecido a tão somente duas semanas de aula, apesar de toda a nossa alegria e entusiasmo com a sua felicidade. I

Isolados em nossa casa devido ao afastamento social necessário, passamos a viver uma realidade que jamais poderíamos ter imaginado e que sequer pudéssemos vir a viver: rígidos protocolos sanitários, uso de máscara e do álcool gel, ao receber, em nossa casa, motoboys trazendo produtos essenciais como alimentos e produtos farmacêuticos,  comprados por aplicativos de celular.


Em nosso nova rotina, passei a incluir algumas atividades físicas, na medida em que o tempo passava e a curva de mortes e contaminação seguia sem previsão de queda. Muito pelo contrário, devido à clara intenção do presidente, contrário ao lockdown e à vacinação compulsória.

Apesar de, há muito, não me dedicar às atividades físicas regularmente, a despeito de, até os primeiros anos do meu segundo casamento, correr, com minha esposa, em volta do Estádio do Maracanã e ainda praticar uma arte marcial, com o passar do tempo, deixe-me seduzir pela preguiça e me tornei sedentário.

Crianças e animais correm bem mais que adultos que se deixam levar pela posição sentada ou deitada. Bem diferente e a infância! Na escola, quando pequeno, meu grande amigo e colega, o Joel, me chamava de frango veloz. 

Também, era a maneira mais fácil que encontrava de fugir de apanhar dele quando eu, propositadamente, implicava com ele. bem maior e bem mais gordo do que eu que sempre fui bem magrinho. 

Entre 1988 e 1990, completei duas maratonas e uma corrida rústica e treinava regularmente no Alto da Boa Vista, já que morava na Tijuca, no Rio de Janeiro. 

Saía da Praça Saens Peña, na Rua Barão de Mesquita, na Tijuca e seguia em direção ao Alto da Boa Vista.  De lá, passando pela Casa do Bispo, seguia até a Vista Chinesa e descia pelo Rio Comprido, já nas últimas semanas antes de minha  segunda  grande corrida. 

Assim,completei a Maratona do Rio de Janeiro, de 1990, em 4h13m, melhorando o meu tempo anterior, dois anos antes, em 39 minutos.

Foi num treino longo, de 30 km, nas semanas que antecederam a prova que descobri a necessidade da rotina de tudo durante o treinamento: a inobservância dos horários de alimentação. Precisei, às pressas, correr para o mato. 


Então, no ano de 2020, devido ao lockdown e isolamento social prescritos pelas autoridades sanitárias,  despeito das diversas tentativas de impedimentos do governo federal e de algumas prefeituras, mal sabia que, a suspensão das aulas presenciais na FAETEC duraria tanto tempo.

Naquele final do dia, fui um dos últimos professores a sair do prédio com a sensação de que, no máximo, em quinze dias, retornaríamos à normalidade.

Em função disto, sem a menor preparação ou planejamento, comecei a trabalhar em home office, e tivemos que nos organizar para que nosso filho tivesse o apoio necessário a uma fase de seu desenvolvimento que necessita sobremaneira de atividades lúdico e pedagógicas. 

Mas, sem a presença do amiguinho e da amiguinha, claro que seria apenas um paliativo, mesmo com meus vários anos de magistério, com especializações e pós graduação em educação, estudante de pedagogia e Ana Paula, com licenciatura plena, já graduada. 



Não nos faltou o devido apoio de quem pudesse nos orientar, principalmente da dinda Carol, pedagoga e coordenadora pedagógica, vovô, vovó e meus e minhas colegas de trabalho, que partilhavam realidade semelhante. 

Claro que logo percebi a necessidade de me esforçar para manter a sanidade, retornando com as sessões de terapia, agora, na modalidade online para o necessário equilíbrio psicológico. 
 

Entretanto, o corpo passou a se ressentir da falta de movimentos, das caminhadas, de subir e descer escadas, de algum esforço além dos poucos dentro de uma casa.

E, num dos meus isolamentos dentro de nossa casa - realidade estranha demais!, trancado em nosso quarto devido à suspeita de contaminação, ao visitar um colega, voltei a fazer exercícios físicos regulares o que, após a quarentena, evoluiu, seguindo o exemplo do meu sogro, para caminhadas no quintal da nossa casa. 

Parece que o corpo se acostuma com tudo, tanto o que é bom quanto com o que é ruim e, digo isto por experiência própria! 

Dois anos após a pandemia, com a queda nos números de óbitos e contaminação no mundo e campanha de vacinação avançando, o Brasil seguiu a tendência e o Rio de Janeiro e decreta o fim do isolamento social com o retorno progressivo das atividades econômicas e culturais. 

Talvez o sedentarismo compulsório tenha sido o grande motivador para pensar em voltar a correr. E isto depois de mais de 35 anos da minha última maratona concluída, entretanto, sedentário, não me arriscaria naquela tentação.



E não poderia ser diferente o início, caminhando pela orla de Sepetiba e, por aconselhamento médico, marquei consulta com vários especialistas, principalmente cardiologista, ortopedista e nutricionista. 

Enquanto caminhava e pedalava algumas vezes por semana, realizava vários exames e, assim permaneci por um ano: segurando uma vontade enorme de voltar a correr! 



Até que, tendo me adaptado a um ritmo confortável em mais de 5 km de caminhada, três dias por semana, retornei ao cardiologista que, depois de verificar pressão, batimentos cardíacos, os resultados de exames de sangue, ecocardiograma, ecodopler, transtoráxica, monitoramento de pressão arterial, teste ergométrico e outros, definitivamente, com os devidos aconselhamentos, me liberou pra voltar a correr o que, também, realizei bem devagar, começando com um ritmo e distância bem tranquilas, correndo pela orla, no final do ano de 2021.


Meu horário de trabalho  me permitia conciliar os treinos, ainda sem um planejamento definido, com o curso de pedagogia na modalidade online e a rotina da minha casa - preparar o café,  e, junto com Ana, acordar, arrumar e levar nosso filho pra creche saindo pro trabalho. 
Algum tempo perfeitamente adaptado a esta rotina, ao retornar, quando possível, ainda regava a grama e molhava as plantas.
E, esta rotina, me permitiu me sentir mais confortável ainda nos 10 km, com pace 7 a 8km/h. 

Sair de casa às 5hs da madrugada, muitas vezes ainda escuro, correndo pelas ruas do bairro, me fez acompanhar a rotina de uma outra Sepetiba, a dos trabalhadores e trabalhadoras com reciclados e, numa destas madrugadas, me impressionei com uma enorme carroça puxada por uma senhora: a pandemia agravou a situação dos pobres revelando abertamente a frieza, ganância e  insensibilidade dos governantes que além de se enriquecer mais ainda, favoreceram muitos dos grandes empresários brasileiros, que nunca lucraram tanto com a tragédia alheia.

Ao contrário do delivery de alimentos e produtos farmacêuticos e hospitalares, o trabalho com reciclados, devido à falta de descarte de embalagens, foi um serviço que sofreu muito com a pandemia e, agora, com o retorno à normalidade, volta a crescer tendo em vista o desemprego, a inflação e a perda de poder aquisitivo das famílias, notadamente, às mais pobres.

Ainda amargamos um desgoverno que não tem a menor capacidade de gerenciar um país continental como o Brasil, que depois de ter zerado a fome, com um programa de excelência inspirado na genialidade do Betinho, volta à linha da miséria e desnustrição crônica.

Não há espaço para estes e estas trabalhadoras dispor de tempo ou de uma adequada alimentação para a prática de algum esporte. A disputa ainda é pelos restos de comida às portas dos supermercados.

Entretanto, neste país de contrastes, há, também, aqueles que podem dispor de um tempo de ócio. Diferentes são as pessoas que encontro quando decido correr exclusivamente pela orla de Sepetiba, em busca de corridas planas, também longas, porém, de maior velocidade, sem disputar com os automóveis, pela ciclovia. 

São casais caminhando de mãos dadas e ouvindo música; uma militante da causa ecológica, catando pets pela areia da praia - nossa memorável e simpática Xuxa, a de Sepetiba -; bombeiros militares da base naval; rapazes que correm numa velocidade admirável, mocinhas com os seus legs e fones de ouvido, dentre outras e outros.

Assim como o cardiologista, a nutricionista comprou o meu desafio: chegar aos 75 anos em pleno vigor, com saúde plena, participando de maratonas, pois, com esta idade, José estaria com os seus 14 anos exigindo muito mais de mim.

A nutriconista me propôs uma dieta de baixo consumo de carboidratos, pois, ainda, não havia mergulhado num dos esportes aeróbicos de maior consumo de calorias: as corridas de rua rumo, com grandes percursos, ruma  às maratonas, pelo que, logo precisou ajustar o meu cardápio aumentando o poder calórico inserindo os flocos de quinoa junto aos ovos e peito de frango.

O meu maior desafio continuava sendo o de ganhar massa magra, pois, com a minha idade, o que é muito fácil, se descuidar da alimentação, com grande ingestão de proteínas, é emagrecer cada vez mais. A alimentação aqui em casa é estritamente ovolactovegetariana, e, portanto, aumentei a ingestão de oleaginosos e voltei a jantar sem descuidar do feijão com arroz diário, lentilha ou grão de bico junto com verduras e folhas escuras.

De duas a três vezes na semana, ainda consumo proteína animal, no almoço no trabalho, o que me satisfaz plenamente, muito mais pela saciedade que, propriamente, pela necessidade alimentar propriamente dita, já que, ainda que não coincida o cardápio do dia, não tenho sentido a fome que sentia antes da reformulação alimentar.

Minha esposa conhece bastante de alimentação vegetariana e vegana, na medida em que, desde a gravidez ela, não só continua cuidando de sua saúde como, também a do nosso filho, que adora brócolis rs

Passei a levar um mix de oleaginosos para o meu lanche, a fim de não passar de 3 horas sem me alimentar, e aumntei o consumo de banana e amendoim, inserindo a quinoa em minha alimentação diária.

Seguindo as orientações de um professor de educação física, também colega de trabalho, para voltar a correr, confiei meus planos a outro amigo e corredor, o Paulo, que me presenteou com um livro, que passou a ser o meu livro de cabeceira sobre corridas, do Dr. Dráuzio Varela. 

Além de trocar muita experiência, logo me convidou a participar de um grupo de corredores apaixonados, pelo WhatsApp, onde, a cada treino concluído, postamos nossos resultados e comentamos o dos colegas, motivando-nos a nos superar.


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